A vida após a prisão: equipes de Psicologia e Serviço Social da DPE-PR auxiliam pessoas privadas de liberdade a recomeçar 08/07/2022 - 14:05

Há, hoje, 33.600 pessoas privadas de liberdade no sistema penitenciário do Paraná. Os dados são do Departamento de Polícia Penal do Paraná (DEPPEN) e estão disponíveis no site do órgão. O sistema possui 26.167 vagas, o que significa um déficit momentâneo de 7.433 vagas. O número varia diariamente porque todos os dias chegam e saem pessoas do sistema, mas os dados já dão a dimensão da complexidade do cenário da Execução Penal no estado e no Brasil, e por trás deles existe um aspecto ainda pouco tratado publicamente: a saída das pessoas privadas de liberdade da penitenciária. Com o objetivo de dar suporte a elas, a Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR) atua de forma multidisciplinar, por meio de profissionais do Serviço Social e da Psicologia, para que quem esteja de saída, prestes a "cruzar os muros", retorne à rotina um pouco mais preparado para enfrentar os obstáculos que marcam a vida de um egresso ou egressa.

Tentar diminuir o impacto dessas adversidades faz parte do trabalho de uma série de servidores e servidoras que trabalham na DPE-PR, como Tânia Moreira, assistente social que atua na Execução Penal. E como fazer isso? Segundo ela, é comum encontrar pessoas privadas de liberdade com vínculos familiares fragilizados por conta do encarceramento ou rompidos antes mesmo da prisão. A reconstrução desse vínculo, na hora em que o preso está de saída, pronto para ir para casa, é um dos principais desafios do trabalho das equipes técnicas que atuam no regime fechado.

“Não é apenas localizar a família, mas iniciar um processo com tentativas de reaproximação familiar, que é algo complexo e que demanda investimento de tempo e de compreensão dos motivos que levaram [pessoa privada de liberdade e familiares] ao afastamento”, comenta a servidora. Esse acompanhamento faz muito a diferença para que o preso possa sair do sistema e ter uma vida pós-encarceramento com mais qualidade, e para que risco de reincidência diminua. Para isso, é importante que o vínculo se mantenha enquanto ele ou ela estiver cumprindo a pena no regime fechado. Ela diz que é importante a pessoa privada de liberdade “ter perspectivas positivas e sonhos para quando progredir de regime. Pessoas que não contam com suporte externo têm mais dificuldades para enfrentar as angústias do cárcere", explica Moreira. 

O psicólogo e servidor da DPE-PR Clodoaldo Porto Filho, que atua em vários projetos de atendimento à população privada de liberdade em Umuarama e região, conta que o período de pandemia da Covid-19 agravou o problema, já que as visitas de familiares foram proibidas por receio de contaminação dessa população em situação de extrema vulnerabilidade. Agora, é necessário que as equipes técnicas atuem para minimizar os efeito desse período. "Como diriam os Racionais MC's, na música Diário de um detento, 'nada deixa um homem mais doente do que o abandono dos parente'. Por isso, a estratégia de localização dessas famílias é vital para a reintegração desses detentos e detentas. É importantíssimo que a gente localize [as famílias], que as famílias possam fazer visitas, que o ser humano possa fazer planos fora daquele ambiente, porque sem planos, sem vínculos e sem referências, há o adoecimento; a saúde mental desses presos e presas fica muito debilitada". 

Após a pessoa ter o alvará de soltura expedido, o trabalho recomeça. As famílias dos presos devem ser avisadas pelas equipes do DEPPEN. Em muitas ocasiões, quando a pessoa é assistida pela Defensoria, o trabalho também é realizado pela instituição, principalmente quando os familiares não são localizados. “Nós fazemos contatos com a rede de atendimento do município de origem da pessoa privada de liberdade para verificar se a família está referenciada aos serviços públicos. Caso positivo, solicitamos o número de telefone e realizamos o contato. Geralmente, são realizados contatos prévios por telefone, whatsapp institucional ou e-mail”, explica.

Outro desafio enfrentado nessa saída é causado pelo horário em que o alvará é cumprido. O Defensor Público Vitor Eduardo Tavares de Oliveira, que atua no Tribunal do Júri de Curitiba, afirma que nem sempre as equipes do Serviço Social do DEPPEN conseguem fazer contato com as famílias. Além disso, muitas vezes, os horários de cumprimento dos alvarás de soltura são inadequados. “Esse é um grande problema. Normalmente, é expedido o alvará de soltura, mas não há horário pré-determinado para que ele seja cumprido. Pode ser a qualquer hora, inclusive em horário em que não há [oferta de] ônibus. Muitos saem sem dinheiro para pegar ônibus, sem sapato, sem casaco no frio”, conta o defensor. A situação relatada é agravada quando a família não é informada. 

A assistente social Tânia Moreira explica que a não localização da família acarreta alguns desdobramentos que impactam negativamente a vida do usuário da DPE-PR e também a própria rotina do sistema penitenciário. Segundo ela, há casos em que a pessoa privada de liberdade não pode ser liberada sozinha sem um aparato que consiga ajudá-la a organizar sua saída. “Existem casos de pessoas que já terminaram de cumprir o tempo estabelecido na medida de segurança de internação, mas que, por terem comprometimentos na área da saúde mental e não contarem com acolhimento familiar nem estatal, ficam aguardando vaga em instituição na própria unidade”, lembra, ao mencionar as pessoas em situação asilar. Já contamos a história delas e a atuação da DPE-PR em seu favor nesta matéria