Defensoria ajuizou 338 ações por vagas em creches em 2022, e trabalha de forma coletiva para fortalecer política pública na área 28/12/2022 - 13:21

A Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR) registrou uma média de um atendimento por dia de pessoas buscando vagas em creches para os(as) filhos(as) neste ano. Foram 338 ações individuais ajuizadas em 2022 nas cidades onde a Defensoria está presente, com o objetivo de garantir vagas na Educação Infantil para crianças em idade pré-escolar. O problema da falta de creches para atender famílias em situação de vulnerabilidade é situação que atinge três em cada quatro crianças, de acordo com dados da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal (FMCSV), problema agravado com a pandemia de Covid-19

Além das ações ajuizadas, que buscam garantir a vaga a crianças cujas famílias buscam atendimento individual na Defensoria, o Núcleo da Infância e Juventude (NUDIJ) da DPE-PR também tem atuado com o tema. Como núcleo especializado, o NUDIJ tem focado em uma atuação coletiva para minimizar os efeitos do déficit de vagas, ou seja, para garantir que a situação seja resolvida por meio de uma política pública eficiente que zere a demanda, evitando que as famílias tenham de ajuizar ação para garantir a vaga para cada criança individualmente.

De acordo com o coordenador do NUDIJ, o defensor público Fernando Redede, o trabalho vai além do atendimento em si, e passa por um monitoramento constante da oferta de vagas, visando a evitar que o déficit aumente e que as famílias sejam todas contempladas sem a necessidade de judicialização. 

“O NUDIJ instaurou um procedimento administrativo cuja finalidade é levantar dados relacionados ao déficit de vagas em creches dos 399 municípios do Estado do Paraná. A coleta dessas informações é essencial, pois permite o monitoramento constante dos serviços municipais no âmbito da Educação Infantil, auxiliando os demais setores da Defensoria na resolução de demandas relacionadas ao tema”, explica o coordenador.

No momento, o NUDIJ aguarda o retorno do ofício enviado aos municípios - 209 prefeituras já responderam - e, a partir das respostas, que serão avaliadas pelo núcleo, será elaborado um relatório e, em seguida, o Núcleo estudará as ações a serem tomadas para garantir um direito fundamental, que está previsto na Constituição, e que não depende de regulamentação por lei, ou seja, sua concretização deve ser imediata, com o aporte de recursos necessários para a oferta das vagas, já que crianças e adolescentes devem ser tratados como prioridade na formulação e execução de políticas públicas.

“O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu recentemente que a Educação Básica é um direito fundamental, ou seja, garantiu que é dever constitucional do Estado assegurar vagas em creches e na pré-escola às crianças de até 5 anos de idade. Tal decisão apenas reforça o quão fundamental é o papel da Defensoria ao proporcionar acesso à justiça para fazer garantir o direito diante de eventuais insuficiências na oferta desse serviço”, diz Redede. 

Um exemplo de atuação individual para garantir a vaga às crianças afetadas pelo déficit é o realizado pela área de Família da sede da DPE-PR em Guarapuava. Cerca de 1.6 mil crianças aguardam na fila pela abertura de vagas nos Centros Municipais de Educação Infantil (CMEI) do município, segundo a Secretaria Municipal de Educação de Guarapuava. 

O Projeto ‘Atendimentos Extrajudiciais na Garantia de Direitos da Criança’ atendeu mais de 100 famílias que buscam vagas em creches para os filhos, e é coordenado pelas assistentes sociais Marlene Myszka, Glaucia Machado e pela defensora pública, Mariela Bueno.

A assistente social Marlene Myszka relembra que esse tipo de trabalho por parte da Defensoria é importante para garantir que os pais, ou quem tenha a guarda da criança, possa trabalhar com tranquilidade, sabendo que o filho (a) está bem assistido (a). O STF, inclusive, quando decidiu que que a Educação Básica é um direito fundamental das crianças, afirmou que ele também se estende às mães ou mulheres que tenham a guarda, uma vez que garantir creche é garantir acesso ao trabalho e emprego às mães, já que as mulheres historicamente são as principais ou únicas cuidadoras das crianças da família.

“A falta de vagas em creche atinge sobremaneira as mulheres mães, que têm sua inserção no mercado de trabalho inviabilizada, e as famílias em situação de maior vulnerabilidade social, que precisam trabalhar para a subsistência própria e a dos filhos, e não possuem condições de arcar com as custas de um(a)cuidador(a) e/ou escola particular”, ressalta Myszka.

A defensora pública Mariela Bueno ressalta a importância de uma ação coletiva por parte dos órgãos competentes para garantir tal direito. “Essas articulações com os demais atores do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente são importantes, pois dão visibilidade à demanda e servem para pressionar o poder público a ampliar a oferta de políticas públicas na área da infância”.

Segundo o defensor Marcelo Lucena Diniz, que atua na área de Família, na sede da DPE-PR em Curitiba, o setor responsável por solicitar essas vagas é o Conselho Tutelar, que busca intermediar a questão junto à Prefeitura. Quando a solicitação não é atendida, a Defensoria Pública é acionada para conseguir a vaga por vias judiciais, o que pode ser prejudicial uma vez que a ação pode tramitar por anos e, quando há uma resolução, a criança já atingiu a idade de ir para a pré-escola.

No entanto, como explica o defensor, embora em praticamente 100% dos casos a ação judicial seja bem sucedida, ela leva tempo. A Defensoria pede que, antes do julgamento do mérito da ação, seja concedida uma liminar para matricular a criança na creche desde logo. No entanto, mesmo que o juízo de 1.° grau conceda a liminar, quando o município recorre para a instância superior, a liminar costuma ser suspensa até o julgamento do mérito - porém, quando isso finalmente ocorre, muito tempo já se passou e o direito já “pereceu” e não pode ser mais exercido. 

O defensor explica que o problema da falta de vagas em creches pode gerar consequências nefastas para a criança e a família, a ponto de, em alguns casos, a criança ser encaminhada para abrigos porque, por permanecer sozinha em casa enquanto pai e mãe trabalham, o poder público entende que ela está sob risco. Por consequência, é ajuizada uma medida de proteção e a criança pode ser retirada da família e encaminhada para acolhimento institucional. 

“Quando não há vaga em creche, a criança acaba sendo deixada com vizinhos, tios ou avós. Em alguns casos, o Conselho Tutelar pode pedir o abrigamento da criança em unidades de acolhimento por entender que ela está sob risco. Então, a questão da falta de vagas em creches pode gerar consequências bem graves à criança e à sua família”, explica.