STF extingue ação penal contra usuária da DPE-PR acusada de aborto após quebra de sigilo profissional de funcionária de hospital 24/05/2024 - 14:42
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes extinguiu uma ação penal contra uma usuária da Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR) ré pelo crime de aborto. O inquérito policial que originou a acusação formal contra ela tomou como base apenas informações repassadas por uma assistente social do hospital, que quebrou o sigilo profissional para denunciar a usuária da Defensoria. Em 2020, a mulher foi internada após ter ingerido medicamentos abortivos.
As informações obtidas da quebra do sigilo, de acordo com a decisão, configuram prova ilegal. A violação também motivou um procedimento administrativo do Conselho Regional de Serviço Social do Paraná contra a assistente social. O recurso chegou ao STF por meio do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (Nudem) e da Assessoria Especial de Tribunais Superiores. Anteriormente, o Superior Tribunal de Justiça negou o pedido de extinção da ação penal feito pela DPE-PR.
De acordo com a decisão, ao tomar conhecimento da situação, uma assistente social que trabalhava no local entrou em contato com a polícia civil, conforme registrado em boletim de ocorrência. No entanto, a confidencialidade e a proteção às informações é previsto no Código de Ética do Assistente Social (Lei Federal nº 8.662/1993) e na Orientação Normativa 4/2020 do Conselho Federal de Serviço Social.
“O respeito ao sigilo e à privacidade dos pacientes é dever de todos os profissionais do sistema de saúde, em observância aos princípios da bioética e ao direito fundamental à intimidade e à privacidade. Esse dever tem particular importância quando as pacientes são mulheres em situação de emergência obstétrica, afinal, o hospital deve ser espaço de cuidado”, afirma Mariana Nunes, defensora pública e coordenadora do Nudem. Ela também explica que a falta de confiança em profissionais dos serviços de saúde pode fazer com que as mulheres omitam informações para o tratamento adequado, um problema grave considerando que as complicações decorrentes de abortos inseguros estão entre as causas mais frequentes de mortalidade materna no país.
Na decisão, Moraes destaca que não há dúvidas sobre o contexto de sigilo profissional em que ocorreu a coleta de informações. Nessas circunstâncias, é necessário o reconhecimento da ilegalidade da prova que originou a ação penal, conforme a decisão. O texto ainda reforça que o STF já consolidou o entendimento de que a prova ilícita contamina as demais provas geradas a partir dela.
A coordenadora do Nudem ainda afirma que esse entendimento vai de encontro à Recomendação Geral n. 24 do Comitê para Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher de Revisão do Brasil (CEDAW) da Organização das Nações Unidas. O comitê é responsável por monitorar o cumprimento da Convenção para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, da qual o Brasil é signatário. “A decisão do STF que reconhece a ilicitude da conduta de profissionais da saúde que violam o dever sigilo e confidencialidade, determinando a extinção da ação penal, representa uma importante conquista para a efetivação do direito à saúde e à dignidade das mulheres”, ressalta a defensora pública.