Para DPE-PR, decisão do STF sobre sistema penitenciário brasileiro pode ser marco civilizatório 04/10/2023 - 15:34
O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, ao concluir o julgamento do pleno sobre a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 347 na sessão desta quarta-feira (04/10), a violação massiva de direitos fundamentais no sistema prisional brasileiro. Além de declarar o “estado de coisas inconstitucional” no sistema penitenciário brasileiro, a Corte determinou que o governo federal elabore um plano de intervenção para resolver a situação. A ADPF foi apresentada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e tramita desde 2015.
Para a Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR), a decisão é um paradigma importante para romper com a sistemática violação de direitos humanos dentro dos presídios e cadeias públicas Brasil afora. A instituição atuou como amicus curiae na ADPF, um termo em latim que significa "amigo da corte" e representa um terceiro interessado em uma causa e com opinião técnica sobre o assunto.
“Na linha de experiências de outros países que levaram à redução do encarceramento, como nos EUA e na Itália, esperamos que a decisão do STF seja o marco de um giro civilizatório nesse tema. Podem certamente contar com a Defensoria para esse desafio, que exerce um papel fundamental de assistência e fiscalização do sistema prisional”, afirmou o defensor público-geral André Ribeiro Giamberardino.
A coordenadora do Núcleo da Política Criminal e da Execução Penal (NUPEP) da DPE-PR, defensora pública Andreza Lima de Menezes, lembrou que a decisão do STF era aguardada há muito tempo. “Afinal, a superlotação ainda é o vetor matriz das violações de direitos humanos das pessoas privadas de liberdade. O Paraná tem 35,5 mil pessoas privadas de liberdade com pouco mais de 28 mil vagas. São 7 mil pessoas vivendo em locais que não foram projetados para comportar a existência delas”, lembrou Menezes sobre a realidade local.
Antes do julgamento, a Assessoria Especial de Tribunais Superiores da DPE-PR apresentou memoriais sobre o tema na Corte. A Assessoria lembrou que a maioria dessas pessoas que estão no sistema penitenciário é atendida pela Defensoria, uma vez que suas condições socioeconômicas as impedem de contratar advogados particulares. A Assessoria destacou também que uma medida importante capaz de colaborar para a redução da superlotação carcerária é a própria expansão da instituição, e recomendou aos Poderes Executivos e Legislativos estaduais que cumpram a disposição constitucional no sentido de implementação da Defensoria em todas as unidades judiciárias do estado. Em 2017, o Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos (NUCIDH) da DPE-PR também se manifestou sobre o tema na ADPF 347.
O julgamento
O julgamento do mérito foi iniciado em junho de 2021, em sessão virtual, quando o relator, ministro Marco Aurélio (aposentado), votou pela declaração do chamado “estado de coisas inconstitucional” no sistema carcerário e propôs uma série de medidas para mitigar a situação. Na última terça-feira (03/10), o ministro Luís Roberto Barroso, em sua primeira sessão na Presidência do STF, apresentou seu voto-vista, ampliando a proposta do relator. A informação é do site do STF.
De acordo com a página da Corte, durante o julgamento, Barroso afirmou que a situação prisional atual compromete a capacidade do sistema de cumprir seus fins de ressocialização e de garantir a segurança pública, e que a superlotação impede a prestação de serviços essenciais que integram o mínimo existencial, ou seja, políticas públicas que devem ser adotadas para garantir o mínimo de dignidade à vida das pessoas. O ministro ressaltou que o fato de os presos estarem sob a custódia do Estado suspende a sua liberdade, mas que outros direitos, como o acesso à saúde, à educação e ao trabalho, permanecem vigentes.
O STF também determinou que o CNJ deverá fazer um estudo para analisar a necessidade de criação de mais varas de Execução Penal proporcionalmente ao número de varas criminais e ao número de presos em cada estado.
O voto pela procedência parcial do pedido do PSOL foi seguido pelos ministros Cristiano Zanin, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luiz Fux, Dias Toffoli, ministra Cármen Lúcia e pelo ministro Gilmar Mendes. O ministro André Mendonça não votou, por ter sucedido o relator.
Superlotação
O plano do Governo Federal, de acordo com o STF, deverá ser elaborado em seis meses, precisará conter diretrizes para reduzir a superlotação dos presídios, o número de presos provisórios e a permanência no sistema em regime mais severo ou por tempo superior ao da pena. Também deverá propor medidas para adequar a salubridade, as condições de higiene, o conforto e a segurança das instalações. O documento será elaborado com a participação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que planejará as medidas que envolvam a atuação do Poder Judiciário. A ideia é que as soluções também abranjam a fiscalização e o monitoramento do sistema prisional.
Os ministros estabeleceram que os estados e o Distrito Federal deverão construir, também em seis meses, planos próprios visando a superar o chamado estado de coisas inconstitucional nas prisões. Em ambos os casos, o prazo para a implementação das medidas será de três anos.
Medidas alternativas
Segundo o STF, a proposta também prevê que, no caso da manutenção de prisão provisória, juízes e tribunais terão que fundamentar expressamente a não aplicação das medidas cautelares alternativas à prisão previstas no Código de Processo Penal. Também recomenda que sejam fixadas penas alternativas, quando possível. Os magistrados ainda deverão levar em conta o quadro prisional do estado no momento da concessão de cautelares penais, na aplicação da pena e durante a execução penal.