Medidas Protetivas: instrumento fundamental para combater a violência doméstica e familiar contra as mulheres 10/10/2022 - 09:09
O total de Medidas Protetivas de Urgência (MPUs) concedidas pela Justiça do Paraná em casos de violência doméstica e familiar contra a mulher aumentou 30% entre 2019 e agosto de 2022. O dado mostra que a Justiça tem sido cada vez mais sensível à importância de se usar esse instrumento, previsto na Lei Maria da Penha, para combater a violência de gênero. Por isso, a Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR), nesta segunda-feira, dia 10 de outubro, Dia Nacional de Luta contra a Violência à Mulher, destaca como essas medidas têm colaborado para salvar vidas.
De acordo com a coordenadora do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (NUDEM) da DPE-PR, defensora pública Mariana Martins Nunes, as MPUs são atualmente o mais importante e eficaz mecanismo de proteção à mulher em situação de violência. “Elas cumprem a função de interromper a escalada de violência e evitar que formas mais graves de agressões ocorram. Embora exista uma descrença do senso comum na efetividade das medidas protetivas, os dados apontam que elas são eficazes em garantir a proteção das mulheres, embora não se negue que é preciso aprimorar a fiscalização das medidas por parte do Estado e dos seus agentes de segurança, e fortalecer toda a rede de atenção à mulher para que se possa conferir maior eficácia e credibilidade ao instrumento”, afirma a defensora.
O relato sobre a eficácia das MPUs é respaldado pelo levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgado neste ano. A Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (ONDH), segundo a publicação, registrou, em 2021, 67.779 denúncias de violência doméstica contra a mulher, das quais 12% diziam respeito ao descumprimento de medidas protetivas de urgência. “Importante destacar também que, no caso de descumprimento da MPU, a mulher pode acionar a Patrulha Maria da Penha ou a Polícia Militar, e que este descumprimento por parte do agressor configura crime, podendo ensejar a sua prisão em flagrante”, comenta.
Para a psicóloga da DPE-PR Jéssica Paula Da Silva Mendes, que faz parte da equipe da Defensoria que atua na Casa da Mulher Brasileira de Curitiba, há uma tendência em se pensar, inicialmente, que a solução da violência envolve apenas a punição do autor. Porém, a violência doméstica exige uma pronta resposta do Sistema de Justiça, focada na mulher e em evitar que ela seja alvo de agressão. “As medidas protetivas viabilizaram essa intervenção imediata, permitindo que, ao denunciar a violência sofrida, a vítima tenha a possibilidade de pleitear medidas judiciais que corroborem para o rompimento do vínculo com o agressor e para a preservação da sua integridade física e psíquica, assim como de seus filhos, se for o caso”, explica a psicóloga.
De acordo com Mendes, o pedido das MPUs tramita com prioridade e deve reconhecer a especial relevância da palavra da vítima, independentemente de eventual ação penal contra o agressor. “Sabe-se que o momento em que a mulher denuncia é justamente o momento de maior vulnerabilidade dela, pelo risco de retaliação [do agressor]. Logo, é essencial, para a proteção da vida dessa mulher, que o Estado responda rapidamente após a denúncia, assegurando-lhe direitos fundamentais por meio das medidas protetivas”, lembra.
De que forma a MPU pode auxiliar a mulher a romper o ciclo da violência? Elas são medidas que podem atuar de duas formas. Há aquelas que impedem o agressor de ter a posse ou o porte de armas, de se aproximar da mulher, dos filhos, parentes ou testemunhas, que o obrigam a se afastar do lar conjugal, entre outras medidas. Há também aquelas que também protegem as mulheres de forma direta, como providenciar acompanhamento policial para que ela possa recolher suas coisas em casa; o encaminhamento dela e dos filhos para casas-abrigo, ou que permitem o seu afastamento da casa sem que ela perca seus direitos em relação aos bens do casal ou em relação à guarda das crianças.
“As medidas protetivas reverberam num contexto macro. Colocam em evidência a necessidade de ressignificação de paradigmas e códigos sociais cristalizados, naturalizados na nossa sociedade patriarcal e reproduzidos, muitas vezes, sem crítica. A imposição de restrições para o convívio e para a dinâmica conjugal, por exemplo, tende a repercutir não apenas no caso concreto, mas na realidade social. Ao estabelecerem novos parâmetros para a relação entre os gêneros, as medidas protetivas evidenciam o que me parece ser o seu potencial pedagógico”, explica a psicóloga da Defensoria.
Como pedir uma MPU?
O pedido de medida protetiva pode ser requerido pela vítima, por meio da autoridade policial, do Ministério Público, de advogado(a) ou da Defensoria Pública. Elas estão previstas no artigo 19 da Lei Maria da Penha. Em Curitiba, a mulher vítima de violência doméstica e familiar pode procurar a equipe da Defensoria na Casa da Mulher Brasileira, na avenida Paraná, n.° 870, Cabral, das 12h às 16h. O atendimento é presencial e por ordem de chegada.
“As medidas protetivas são instrumentos de proteção sobretudo jurídica. Proteção esta que pode evitar que uma mulher esteja suscetível a sofrer novas e mais graves violências, mas enxergo outros efeitos práticos das medidas protetivas”, diz a psicóloga. Segundo ela, as medidas permitem, por exemplo, que a realidade concreta vivida por cada mulher seja reconhecida pelo Sistema de Justiça e seja considerada na aplicação das medidas judiciais disponíveis para superar a situação de violência.
Na avaliação de Mendes, é possível compreender as medidas como meio de resgate da capacidade de autodeterminação da mulher em situação de violência doméstica, ao assegurar o distanciamento dela do agressor e, por consequência, de toda uma dinâmica de manipulação e controle exercida por ele. “Além do afastamento físico, é possível falar em um afastamento simbólico, essencial para que essa mulher tenha condições de desenvolver e fortalecer a sua autonomia”, afirma.
A psicóloga ainda menciona que, contudo, não se deve pensar nas MPUs como instrumento único de proteção para as mulheres. “Entendendo que a vulnerabilidade da mulher que sofre violência doméstica é organizacional, ou seja, diz respeito a todos os aspectos da sua vida, e somente é possível pensar a sua proteção integral a partir de ações interseccionais, judiciais e extrajudicialmente”, conclui.
Total de dados de Medidas Protetivas de Urgência (MPUs) concedidas pela Justiça no Paraná
2019 – 23.449
2020 – 22.472
2021 – 25.895
2022 (de janeiro a agosto) – 33.844
Fonte: Cevid/TJPR