Mãe multada por não conseguir acompanhar rotina escolar dos seis filhos durante a pandemia tem condenação anulada após atuação da DPE-PR 17/03/2022 - 08:43

A Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR) em Cornélio Procópio conseguiu anular uma sentença que condenava a mãe de seis crianças ao pagamento de três salários mínimos por não ter realizado o acompanhamento escolar dos filhos durante a pandemia. Por unanimidade, as(os) Desembargadoras(es) da 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná decidiram pela nulidade do julgamento, em razão do fato de a mulher não ter tido acesso à defesa.
Na denúncia, o Ministério Público alegou que as crianças – quatro meninas e dois meninos com idades de 5 a 13 anos – estavam com as atividades escolares em atraso e baixo aproveitamento escolar, e que a mãe havia sido advertida diversas vezes pelo Conselho Tutelar e pelas instituições de ensino quanto aos seus deveres com relação ao ensino de suas filhas e filhos, porém, as crianças continuaram com as atividades escolares em atraso.
O MP, então, pediu a condenação da mãe em razão da infração administrativa prevista no artigo 249 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que dispõe que “Descumprir, dolosa ou culposamente, os deveres inerentes ao poder familiar ou decorrente de tutela ou guarda, bem assim determinação da autoridade judiciária ou Conselho Tutelar” pode ocasionar a pena de multa de três a vinte salários, “aplicando-se o dobro em caso de reincidência”. Também pediu a aplicação, como forma de medida de proteção, da obrigação de garantir a matrícula, frequência e aproveitamento escolar das crianças, que está prevista no artigo 129, inciso V, do ECA.
Foi somente após a condenação que a Defensoria Pública tomou conhecimento do caso; a mulher havia sido julgada “à revelia”, sem que alguém tivesse feito a sua defesa na Justiça, e a DPE-PR entrou com um recurso de Apelação para garantir o seu acesso à defesa. A Defensora Pública responsável pelo caso, Aline Valério Bastos, defendeu que a pandemia trouxe graves consequências para a vida das pessoas, especialmente para as famílias mais pobres.
Em relatório elaborado pela equipe técnica da DPE-PR em Cornélio Procópio, a Assistente Social Hellen Maysa Piva e o Psicólogo Francisco da Silva Reis Filho anotaram que a mulher estava desempregada na época e que tinha dificuldade para encontrar trabalho, justamente por não ter com quem deixar as crianças. Seu ex-marido, pai das crianças, mora em outro estado e contribui com R$750 reais mensais, dos quais R$350 são utilizados para pagar a casa alugada onde ela e as crianças vivem.
Para além das dificuldades econômicas, havia ainda a dificuldade de instruir as crianças em diferentes matérias de diferentes séries escolares. A mulher, segundo a Defensoria, precisaria, além de lutar para se inserir no mercado de trabalho, dar conta de auxiliar nas atividades diárias de cada uma das filhas e filhos, uma grande sobrecarga de trabalho para uma mãe solo. Além disso, o Estado, que de acordo com a Constituição Federal tem total obrigação de fornecer Educação às crianças brasileiras, não proporcionou à família o acesso aos meios para garantir a educação em regime domiciliar/virtual.
Para a Defensora, a mulher “fez de tudo o que estava ao seu alcance, mas sua situação social e até intelectual não a permitia efetivamente exercer essa obrigação de funcionar como professora/gestora da educação formal dos filhos”. Na Apelação, ela questionou: “Quais condições/ferramentas estavam à disposição da recorrente? Como puni-la por suas próprias condições sociais?”. Por fim, a Defensoria ainda defendeu que a aplicação da multa traria mais prejuízos às crianças, por se tratar de uma família de pouquíssimos recursos financeiros.
No momento, é importante ressaltar, as crianças se encontram matriculadas na escola e frequentando as aulas de maneira presencial.