DPE-PR RESPONDE: Dúvidas que você sempre teve sobre ENSINO RELIGIOSO NA ESCOLA PÚBLICA 22/06/2023 - 15:45
O Brasil é um país de muitas crenças e, ao mesmo tempo, de nenhuma delas. A nossa Constituição Federal estabelece que “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias” (artigo 5) ao passo que também estabelece que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não podem realizar cultos religiosos ou adotar ou criar igrejas, não podem ajudar e nem atrapalhar o funcionamento delas ou manter com essas igrejas ou cultos, ou seus e suas representantes, relações de dependência ou aliança, a não ser que essa colaboração seja de interesse público (artigo 19). É por esta razão que dizemos que o estado brasileiro é laico: deve proteger a liberdade de crença e o direito de todas as religiões existirem em nosso território, mas não pode professar nenhuma delas.
Mas e quando se trata do ensino público? Quais são os limites para a profissão de fé dentro das escolas que são administradas pelo Estado? Fomos investigar como fica essa relação nas escolas públicas do Paraná que são administradas pela Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED). Confira!
O ensino religioso, segundo as leis do estado do Paraná, deve abordar o quê? Há um currículo para essa disciplina?
Sim, o Paraná conta com um Referencial Curricular que segue a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Esse documento estabelece que as competências específicas do Ensino Religioso no Paraná são: “Conhecer os aspectos estruturantes das diferentes tradições/organizações religiosas e filosofias de vida, a partir de pressupostos científicos filosóficos, estéticos e éticos; compreender, valorizar e respeitar as manifestações religiosas e filosofias de vida, suas experiencias e saberes, em diferentes tempos, espaços e territórios; reconhecer e cuidar de si, do outro, da coletividade e da natureza, enquanto expressão de valor da vida; conviver com a diversidade de crenças, pensamentos, convicções, modos de ser e viver; analisar as relações entre as tradições religiosas e os campos da cultura, da política, da economia, da saúde, da ciência, da tecnologia e do meio ambiente; e debater, problematizar e posicionar-se frente aos discursos e práticas de intolerância, discriminação e violência de cunho religioso, de modo a assegurar os direitos humanos no constante exercício da cidadania e da cultura de paz”. O currículo da Rede Estadual Paranaense para o Ensino Religioso está disponível aqui, no site do Governo do Estado.
Este Referencial Curricular do Paraná aborda quais religiões serão estudadas? Qual é o critério para a escolha?
Para responder a essas questões, ouvimos a Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED), que nos forneceu as seguintes respostas: “Conforme consta no próprio Referencial, o desenvolvimento das práticas pedagógicas de Ensino Religioso deve ser conduzido de forma que as diferentes expressões religiosas sejam abordadas com respeito, isonomia e imparcialidade. Ainda que não haja uma neutralidade absoluta por parte dos(as) professores(as), pois, também estão inseridos no universo cultural religioso, é fundamental evidenciar que o componente curricular Ensino Religioso, como área do conhecimento, deve ter uma abordagem pedagógica a partir de pressupostos éticos e científicos, não podendo ser um espaço confessional e não privilegiar nenhuma crença. Em outras palavras, as diversas culturas e tradições religiosas devem ser integradas ao currículo”.
Ainda de acordo com a SEED, “No Referencial Curricular para o Ensino Religioso constam Unidades temáticas de Crenças Religiosas e Filosofias de Vida e Manifestações religiosas (contemplando as Quatro Matrizes: Indígena, Ocidental, Africana e Oriental). Esses são alguns dos conteúdos previstos para abordar as unidades temáticas, relacionadas aos objetivos de aprendizagens”. A Secretaria ainda destaca que um dos objetivos de aprendizagem nesta disciplina é “Reconhecer e valorizar a diversidade de textos religiosos escritos e orais (textos do Budismo, Cristianismo, Espiritismo, Hinduísmo, Islamismo, Judaísmo, Indígenas e Africanos)”.
Em relação ao critério para a escolha, a SEED afirma que, em respeito ao parágrafo 2.° do artigo 33 da Lei 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), o qual dispõe que “os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso”, “aqui no Paraná, para a construção do Referencial Curricular foram ouvidos o Fórum Nacional de Pesquisa em Ensino Religioso (Fonaper), de caráter acadêmico e científico, e a Associação Inter-Religiosa de Educação e Cultura (Assintec), que reúne representantes autorizados das tradições religiosas, além de uma equipe pedagógica que faz a transposição didática dos conhecimentos, obtidos diretamente com as organizações religiosas, em práticas pedagógicas para sala de aula”.
Grupos religiosos podem dar palestras ou fazer outros eventos em escolas?
Sim, contudo, deve ser disponibilizada atividade alternativa para alunos(as) que não queiram participar da atividade de cunho religioso.
As(os) estudantes podem ser proibidas(os) de usar símbolos religiosos nas escolas?
Desde que o símbolo não esteja vinculado a discurso de ódio e intolerância – como, por exemplo, a adoção da cruz de ferro por neonazistas –, não se pode fazer tal proibição.
Estudantes podem se reunir por conta própria em ambiente escolar para realizar manifestações religiosas, como organizar grupos de oração, cultos ou cantar músicas religiosas nos intervalos das aulas, por exemplo?
Como expressão do direito de liberdade, desde que não atrapalhe atividades acadêmicas realizadas por outras(os) estudantes ou atividades organizadas pela escola, é plenamente possível. Orar, cantar músicas no momento do intervalo, fazer algum ato religioso é possível, desde que de acordo com o uso do espaço. Isso, além de liberdade religiosa, é liberdade de expressão. Assim como a(o) estudante pode utilizar signos e emblemas da sua religião, ela(e) também pode falar sobre ela, compartilhar isso entre colegas dentro do horário em que isso é possível, isto é, não durante as aulas ou em atividades culturais organizadas pela escola em que não sejam autorizadas essas manifestações.
Caso algum(a) estudante se sinta atacado(a) em sua fé dentro do ambiente escolar, a quem ele(a) pode recorrer?
A Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED) disponibiliza um canal de comunicação para reclamações e denúncias, a Ouvidoria Educação-PR. O telefone é o 0800-041-9192 e o horário de atendimento é das 8h às 18h, de segunda a sexta-feira. No site www.educacao.pr.gov.br/Ouvidoria é possível obter mais informações sobre o serviço, inclusive os telefones da Ouvidoria nos Núcleos Regionais de Educação de todo o Paraná.
Para finalizar, é importante destacar que a disciplina de ensino religioso deve ser obrigatoriamente ofertada nas escolas, mas os(as) estudantes podem optar por não frequentá-las.
E em relação às escolas municipais e às escolas particulares, especialmente àquelas chamadas “confessionais”, diretamente ligadas a igrejas ou instituições religiosas, elas também precisam respeitar as competências específicas, unidades temáticas, objetos de conhecimento e habilidades para o Ensino Fundamental estabelecidas pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), mas têm autonomia para ampliar o currículo de acordo com suas realidades. Acesse aqui a BNCC para saber mais.
Caso ainda tenha dúvidas ou queria relatar abusos em relação a este tema, você pode procurar o Núcleo da Infância e Juventude (NUDIJ) da DPE-PR através do e-mail nudij@defensoria.pr.def.br ou presencialmente, de segunda a sexta, das 13h às 17h, na Rua Benjamin Lins, nº. 779, no bairro Batel, em Curitiba. E caso você tenha dúvidas sobre como funciona o ensino religioso nas escolas do seu município, entre em contato com a secretaria municipal da Educação local para obter mais informações.