Conheça a atuação da Defensoria Pública no enfrentamento e prevenção da violência nas escolas 17/04/2023 - 14:50

Um dos papéis da Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR) é promover a educação em direitos e também formular, propor e monitorar políticas públicas direcionadas a grupos em situação de vulnerabilidade que são atendidos diariamente pela instituição. No que diz respeito às crianças e adolescentes, esse trabalho é coordenado pelo Núcleo da Infância e Juventude (NUDIJ), em parceria com defensores(as) e servidores(as) que atuam no atendimento, e nos últimos dias, diante da escalada de violência em creches e escolas país afora, o núcleo tem reforçado a importância de se discutir o tema com profundidade e responsabilidade, a fim de promover uma cultura de respeito e empatia entre e para com crianças e adolescentes no ambiente escolar, onde eles e elas passam grande parte de sua infância e adolescência. 

No Paraná, de acordo com a Ouvidoria da Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED), do início do ano até o fim de março, 117 denúncias de bullying e outras formas de violência foram registradas em instituições de ensino da rede pública estadual. As agressões físicas lideram as estatísticas: 48 ocorrências. 

Os dados revelam uma situação de insegurança vivida pelos(as) estudantes paranaenses, cenário que se repete a nível nacional. Nesta última terça-feira (11/04), um estudante atacou três colegas com arma branca e tentou ferir uma professora em uma escola de Goiás. Esse foi o quarto atentado em uma instituição de ensino no Brasil nos últimos 15 dias – um dos episódios mais traumáticos envolveu o assassinato de quatro crianças em uma creche de Blumenau (SC) no dia 5 de abril. 

Diante dos ocorridos, a sociedade tem discutido as motivações por trás da cultura de violência em ambientes escolares que se arrasta pelo país, e as alternativas para superar o problema. Um dos aspectos mais debatidos diz respeito ao impacto do bullying para o cometimento de violências por parte de estudantes e ex-estudantes que atacam colegas e professores(as), uma vez que eventualmente são publicadas informações sobre o perpetrador da violência ser ou ter sido uma criança ou jovem que sofre ou sofria tal prática.

Embora não seja possível afirmar que o bullying é uma causa dessa violência, ou o quanto o bullying pode estar de alguma forma associada a esses episódios, a prática de fato gera grande impacto na vida das vítimas e de quem está no seu entorno (colegas, docentes, familiares), causando sofrimento psíquico, evasão escolar, problemas de socialização e consequências graves para seu futuro. Ela é, em si, uma forma de violência, e deve ser prevenida e erradicada - ainda, é preciso ressaltar que crianças e jovens vítimas de bullying, em sua imensa maioria, jamais chegam a cometer atos de violência como os vistos nos últimos dias, logo, é preciso tomar cuidado com associações e explicações simplistas. 

Conforme a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), crianças e adolescentes são prioridade absoluta, e devem ser privilegiados quando o assunto é a oferta de cuidados em situações de violência. No que diz respeito ao bullying, é importante proteger a vítima e evitar que ela se sinta culpabilizada.

"Se uma violência acontece em um ambiente escolar, quem deve sofrer eventual consequência é o agressor, seja um aluno ou um profissional, que deve ser afastado. O ideal é que a vítima não precise, por exemplo, trocar de escola", analisa Fernando Redede, defensor público e coordenador do NUDIJ.

Além disso, as equipes da instituição devem orientar e encaminhar crianças, adolescentes e famílias que precisem de atendimento psicoterapêutico à rede de apoio escolar. A prestação de serviços de Psicologia e de Serviço Social na rede pública está prevista na legislação brasileira desde 2019, a partir da Lei 13.935. O texto define que profissionais dessas áreas devem desenvolver ações que envolvam toda a família. 

"A presença desses profissionais no ambiente educacional contribui para a qualidade do ensino, a garantia de direitos e o enfrentamento aos preconceitos e à violência e, portanto, é importante e urgente que ela seja implementada em toda a rede pública de educação básica", destaca Lethicia Gaidarji Silva, psicóloga que presta assessoria técnica à equipe jurídica do NUDIJ. 

O defensor público Fernando Redede também afirma que a lei traz mecanismos para tentar proporcionar mais segurança dentro dos espaços de ensino. É o caso do Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying), instituído em 2015, que norteia as ações do Ministério da Educação e das Secretarias Estaduais e Municipais de Educação. "A legislação impôs aos estabelecimentos de ensino, clubes e agremiações recreativas o dever de assegurar medidas de conscientização, prevenção, diagnóstico e combate à violência e à intimidação sistemática", explica o defensor. 

O NUDIJ defende que escolas públicas e privadas devem se organizar para criar espaços em que o direito dos estudantes ao pleno desenvolvimento seja assegurado. "É uma obrigação nossa, enquanto órgãos de direito, o que inclui o sistema de Justiça como um todo, buscar a efetividade desses direitos previstos", reforçou Redede. 

Desde novembro de 2022, a DPE-PR integra um grupo de trabalho que reúne diferentes entidades do estado no combate à violência nas escolas. A ação conjunta busca propor medidas para aprimorar e dar suporte à atuação dos e das profissionais da educação na identificação de violências, e instituir e fortalecer os canais de denúncia na Ouvidoria da SEED, por exemplo. 

Canais de denúncia e apoio psicológico

O canal oferecido pela Secretaria de Educação é a principal ferramenta de comunicação entre os(as) responsáveis pela criança e/ou adolescente e as autoridades do estado. O envio da reivindicação ao órgão permite que seja feita uma investigação sobre a denúncia. A Defensoria Pública, por meio do NUDIJ, mantém diálogo com a Ouvidoria para acompanhar o encaminhamento dado aos registros feitos pela SEED.

 

Imagem de infográfico em barras com os números de registros de violência recebidos pela Ouvidoria da Secretaria de Educação do Paraná em 2022

 

Ao constatar situações de bullying ou outras formas de violência em escolas, a DPE-PR pode intervir junto às instituições de ensino para buscar resolver o problema e também atuar na defesa coletiva das vítimas. Segundo o defensor público Fernando Redede, "a Defensoria Pública poderá atuar tanto na esfera administrativa, por exemplo, a partir da emissão de ofícios solicitando esclarecimentos sobre a situação e recomendações para que as práticas de bullying cessem, quanto judicial, com a proposição de ações para a tutela dos direitos lesados". 

O Núcleo também reforça a importância de se acionar outros canais de atendimento em situações de violência, como o Conselho Tutelar e o Ministério Público. 

Ciberbullying e cultura extremista

Na última segunda-feira (10/04), a Defensoria Pública em Cornélio Procópio realizou uma palestra no Colégio Estadual Vandyr de Almeida para conversar com estudantes do oitavo e nono anos sobre bullying. O psicólogo da DPE-PR Luã Dantas abordou o sofrimento psicológico pelo qual passa a vítima dessa violência a pedido da diretora da instituição de ensino. Segundo Dantas, os participantes da conversa tiraram dúvidas sobre a quem recorrer em casos de intimidação e demonstraram interesse em entender o cyberbullying, ou seja, quando o bullying é praticado na internet.

"Décadas atrás, se uma pessoa praticava bullying, essa intimidação era restrita ao local onde ele acontecia. Agora, como podemos observar no cotidiano, as redes sociais são muito importantes nas nossas vidas e potencializam a prática do bullying. Se antes um apelido vexatório seria de conhecimento de uma classe, ou de um turno do colégio, agora ele pode ser propagado para milhares de pessoas", comentou Dantas. Ele ainda ressaltou que essa forma de intimidação pode ocorrer sem o conhecimento dos(as) professores(as), por exemplo, em grupos privados de mensagem.

Outro fator ligado às relações na internet que intensificou o problema da violência escolar foi o maior acesso a grupos extremistas. Um estudo conduzido por pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que mapeou 23 ataques em escolas brasileiras desde 2002, revela que na maioria dos casos as agressões praticadas por jovens têm motivações ligadas a grupos radicais online que pregam a violência.

O psicólogo da Defensoria esclarece que os pais de crianças e adolescentes devem buscar criar um espaço de diálogo dentro de casa focado no acolhimento e na compreensão, como forma de prevenir que seus(as) filhos(as) sejam atraídos por discursos extremistas. Segundo ele, a busca por pertencimento é uma das características da adolescência, e os jovens podem ingressar em grupos e fóruns por sentir que recebem reconhecimento. "É importante também que os pais observem as atividades dos filhos na rede mundial de computadores, e conforme os filhos vão ganhando autonomia, esse uso pode ser mais livre, porém, a questão é que muitas crianças e adolescentes usam as redes sem nenhum tipo de supervisão e acabam confiando nesses grupos", conclui. 

 

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