Como a Defensoria Pública pode ajudar ex-casais a regulamentar a guarda dos animais após o fim da união? 05/04/2023 - 14:54

A Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR), entre os vários serviços jurídicos gratuitos que disponibiliza à população na área de Família, também oferece orientação e assistência jurídica para ex-casais que estejam discutindo a guarda de animais domésticos após o divórcio ou dissolução da união estável. A regulamentação pode ocorrer pela via judicial ou extrajudicial, a depender do caso, assim como a guarda de filhos(as). Esse tipo de demanda, que ainda não foi objeto de lei ou de decisão que trate especificamente do assunto, cresceu nos últimos anos, principalmente por conta do maior interesse de tutores e tutoras que consideram o pet um integrante da família.

Quando os tutores não conseguem chegar a um consenso sobre com quem ficará o pet e também sobre a divisão de gastos e condições para a visita, o caso precisa ser resolvido na Justiça, por meio de uma ação judicial. Se a situação puder ser resolvida amigavelmente, o caminho é mais ágil e rápido, e a equipe da DPE-PR pode auxiliar e orientar as partes sobre como realizar e formalizar o acordo, que irá definir os direitos e deveres do(s) responsável(s) sobre os cuidados com o animal.

Para o defensor público e coordenador do posto da Defensoria na Assembleia Legislativa do paraná (ALEP), Matheus Cavalcanti Munhoz, a prestação desse serviço gratuito por parte da DPE-PR, enquanto instituição garantidora de direitos, representa uma adequação do sistema de Justiça às mudanças sociais, e à forma pela qual os animais passaram a ser vistos. "Juridicamente, os animais são tidos pelo Código Civil como um objeto, uma propriedade, mas a relação de afeto entre o ser humano e o animal doméstico se desenvolveu com o tempo, e, necessariamente, o olhar da Justiça precisa se desenvolver da mesma forma", analisou Munhoz.

Ainda não há legislação que assegure os direitos dos bichinhos em relação à guarda e outras questões. Os acordos que envolvem guarda se baseiam em precedentes da jurisprudência, ou seja, julgamentos já realizados por tribunais país afora que ajudam juízes e juízas a decidir os casos que chegam até eles e elas. 

A guarda de animais de estimação passou, em 2018, por discussões no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que entendeu, na ocasião, não ser possível ignorar a relação entre o indivíduo e seu pet durante os procedimentos de separação. No ano seguinte, o Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) também tratou da questão em julgamento parecido, e destacou que hoje em dia os animais são integrantes das relações familiares. No entanto, não há decisão que tenha pacificado a questão em todo o país, ou seja, uma decisão que determine a cada juiz ou juíza como resolver a questão. 

"A Defensoria deve estar preparada para receber esse tipo de demanda, e é o que vem acontecendo. A população tem recebido toda a assistência jurídica e a educação em direitos necessárias para tanto, e os direitos dos animais têm sido respeitados e garantidos perante os tribunais de justiça", ressaltou o defensor público Matheus Munhoz. 

Por meio da via consensual, os(as) responsáveis pelo bichinho decidem entre eles(as) sobre a situação, realizam o acordo junto à DPE-PR e aguardam a homologação por meio de uma sentença judicial. Já pela via litigiosa, isto é, quando o caso precisa ser judicializado, é feito um pedido de abertura de ação na Justiça por uma das partes envolvidas, o que leva a um processo para a discussão entre tutores(as) e, por fim, à decisão do Poder Judiciário sobre a guarda do animal.

Guarda de animais domésticos na prática

O  auxiliar administrativo Diego Freitas, de 33 anos, conseguiu regularizar por meio da DPE-PR a situação de Kira, Yuki e Aika, as três gatas de que ele cuidava juntamente com a ex-esposa. Quando decidiu solicitar a dissolução da união estável, o casal procurou os serviços da Defensoria e comunicou também o desejo de chegar a um acordo sobre as pets. 

"Durante o acordo, perguntaram se nós gostaríamos também de decidir sobre a tutela das gatinhas. Na visita à Defensoria, o atendimento foi sensível e a questão foi resolvida rapidamente", contou Freitas. Ele esteve presencialmente na conciliação, e a ex-companheira, que atualmente mora em São Paulo, participou de forma remota.

A distância geográfica entre os tutores, inclusive, foi um fator que impactou na decisão sobre os bichinhos. Segundo o auxiliar administrativo, uma das gatas sofreu com o calor e a desidratação durante uma viagem feita de Curitiba para a capital paulista. Logo, forçar o deslocamento constante entre estados poderia atrapalhar a saúde dos animais, e a melhor opção, assim eles entenderam, seria manter os três pets sob a responsabilidade apenas da tutora.

"Duas gatinhas já eram mais afeiçoadas a ela [a ex-esposa], só uma era apegada mais a mim. Para elas, importam mais as relações entre animais da mesma espécie que as relações com os humanos, então, preferimos não deixar uma separada das outras", explicou Freitas, que então acordou com a ex-companheira que as três gatinhas viveriam juntas em São Paulo. 

 

Imagem com três fotos das gatas Kira, Yuki e Aika.
As gatinhas Kira, Yuki e Aika.

 

O procedimento foi finalizado no último mês de fevereiro e realizado pela equipe do Posto da Defensoria Pública na Assembleia Legislativa do Paraná (ALEP). O trabalho no local é voltado para a resolução extrajudicial de demandas. Conforme a assessora jurídica Simone Maia, que atendeu Diego no Posto da ALEP, a tutela de animais é sempre abordada no termo de acordo de divórcio ou dissolução de união estável. Algumas pessoas optam por formalizar o acordo, como foi o caso do ex-casal, mas outros não acham necessário. 

Recentemente, segundo a assessora, mais pessoas têm demonstrado interesse em formalizar a tutela dos animais no momento da separação. Para definir a guarda dos bichinhos, a Defensoria tem solicitado apenas a documentação que já é necessária para a realização do divórcio ou da dissolução de união estável. Confira a relação de documentos no fim da matéria.

Residência, despesas e convivência com o pet

Os aspectos que envolvem a guarda do bicho de estimação podem ser definidos pelos tutores no momento do acordo. Entre as questões que precisam ser resolvidas, estão, por exemplo, em qual residência o animal vai morar, quem vai arcar com as despesas e qual será a frequência e os termos de convivência do outro tutor com o bichinho, em caso de opção pela guarda compartilhada.

No caso específico de Diego Freitas, ficou definido que a ex-companheira e tutora das gatas seria responsável por todos os custos com alimentação, higiene e outros. Na dissolução ficou acertado, inclusive, que ela passaria a ser a única tutora dos bichinhos.

Para o auxiliar administrativo, a agilidade com que o serviço da Defensoria foi feito permitiu encerrar de vez, e da melhor forma possível, a relação que se estabelecia entre ele, a ex-esposa e, por consequência, os animais. "Para mim, a conciliação não é 'só um documento'; ela representa uma página virada na vida", concluiu ele.

Apesar de não ser mais tutor das gatinhas, Diego buscou garantir, por meio do acordo junto à Defensoria, a dignidade necessária a elas. O documento determina as responsabilidades sobre elas, o que evita que os pets fiquem desassistidos e abandonados em algum momento.

Documentação

Tanto para o procedimento extrajudicial quanto para o processo judicial, os documentos que devem ser trazidos no atendimento da Defensoria Pública são: 

* comprovante de residência atualizado;

* comprovante de renda (holerites, CTPS, extratos bancários etc.);

* certidão de casamento.

Quando o divórcio ou dissolução de união estável não for amigável (do tipo litigioso), pode ser que o(a) interessado(a) em propor a ação não tenha os documentos da outra parte. Nessa situação, quem buscar o serviço precisa informar alguns dados pessoais e endereço da outra parte, se souber.

No caso de dissolução de união estável, ao invés da certidão de casamento, o ex-casal precisa apresentar a declaração de união estável firmada em cartório. 

Caso as partes queiram fazer um acordo sobre a partilha dos bens adquiridos durante a união, devem apresentar os documentos dos bens (matrícula do imóvel, documentos do automóvel etc.).

Para acessar os canais de comunicação com o Posto da Defensoria na ALEP, acesse aqui.