CNJ lança painel com dados sobre maternidade e paternidade no sistema prisional. Conheça a atuação da DPE-PR na área 12/10/2022 - 14:58

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) divulgou há pouco mais de uma semana um painel online que permite monitorar dados referentes a pessoas privadas de liberdade que são gestantes ou mães, pais ou responsáveis por crianças de até 12 anos e/ou por pessoas com deficiência. Os dados permitem aferir como a situação prisional impacta não apenas a vida dessas pessoas, mas também a de filhos, filhas e outras pessoas dependentes de seus cuidados. Há dados disponíveis do Departamento Penitenciário Nacional e do Sistema de Execução Penal Unificado, entre outras fontes que fazem parte de um grupo de plataformas públicas de gestão de dados na área. 

A iniciativa pretende dar mais transparência a esses dados e acompanhar o cumprimento dos artigos 318 e 318-A do Código de Processo Penal e das ordens concedidas pelo STF nos Habeas Corpus n.º 143.641/SP e n.º 165.704/DF, que determinam a substituição da pena privativa de liberdade por prisão domiciliar a esses grupos sempre que possível. O painel também vai ao encontro do trabalho feito cotidianamente pela Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR), que tem atuado para garantir que pessoas privadas de liberdade no estado que se adequem a esse perfil exerçam seus direitos conforme prevê a legislação vigente. 

No fim de 2021, a título de exemplo, de acordo com painel, havia no sistema penitenciário do Paraná 10 gestantes e três lactantes, com um total de 36 filhos sob seus cuidados. Já em agosto deste ano, havia duas mulheres gestantes no sistema penal do Paraná. O cenário se modifica diariamente, com a entrada e saída de pessoas do sistema, no entanto, é possível encontrar mulheres privadas de liberdade que se encaixam neste cenário praticamente toda semana.

A DPE-PR trabalha constantemente para monitorar a situação das mulheres no cárcere por meio do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (NUDEM), do Núcleo da Política Criminal e da Execução Penal (NUPEP) e dos(as) defensores(as) com atribuição na área de Execução Penal nas cidades onde há atuação da Defensoria. O NUDEM está atuando em três casos recentes de abortos ocorridos dentro do sistema prisional para que haja a responsabilização do Estado e indenização às gestantes vítimas.

“Embora haja lei que garanta expressamente o direito das mulheres gestantes, lactantes e mães de crianças pequenas à prisão domiciliar, o que se verifica na prática é uma enorme resistência do Judiciário em aplicar a determinação legal, violando, assim, não apenas o direito das mulheres, mas também o direito das crianças. Essa resistência é em grande medida reflexo de uma cultura patriarcal, machista e punitivista que deixa de efetivar direitos garantidos na legislação a partir do juízo de valor sobre qual tipo de mulher merece ou não cuidados especiais durante a gestação, e qual tipo de mulher pode ou não ficar com os próprios filhos e filhas”, afirma a coordenadora do NUDEM, defensora pública Mariana Martins Nunes

De acordo com a defensora, é relativamente comum que o sistema de justiça criminal negue o direito da gestante privada de liberdade à prisão domiciliar com o fundamento de que a saúde delas estaria resguardada no sistema penitenciário. “Porém, sabemos da precariedade das instalações físicas e da insuficiência das equipes de saúde [para atendê-las], o que inclusive coloca em risco a gestação e a vida das mulheres”, explicou ela. 

Em razão disso, o NUDEM pactuou, junto à direção dos estabelecimentos penais do estado, para que o Núcleo será imediatamente comunicado caso haja o ingresso de gestantes no sistema, a fim de que a Defensoria possa realizar o pedido de liberdade provisória ou de prisão domiciliar em benefício dela. 

No interior do estado, um projeto que tem trabalhado esta questão é o “Sexta-feira na cadeia”, em Umuarama. “A gente trabalha bastante esse tema no projeto. Vamos até a cadeia pública local para entrevistar pessoas privadas de liberdade e, às vezes, há algumas mulheres que esperam de 24h a 48h para serem transferidas para Goioerê. Conseguimos atuar no caso das gestantes e de pessoas com filhos menores de 12 anos e sempre pedimos a prisão domiciliar”, explica o defensor público Cauê Ribeiro, que atua em Umuarama nas áreas Criminal e de Execução Penal.

Conforme prevê o artigo 318 do Código de Processo Penal para esses casos, a prisão domiciliar é proposta como medida substitutiva da prisão preventiva. “Essa é uma pessoa que não tem condenação. Para pessoas já condenadas o pedido é um pouco mais difícil [de ser concedido], porque pela Lei de Execução Penal, esse direito só é previsto para quem está em regime aberto. Até tentamos solicitar o direito, dependendo de cada caso, para quem está no regime fechado, mas os maiores casos de êxito são de pessoas que estão presas preventivamente”, menciona Ribeiro. 

De acordo com o defensor, esse trabalho é muito importante em razão não só do ponto de vista do direito da mulher, mas também da criança. “Existe um princípio básico no Direito Penal que é o da “Intranscendência das penas”, que afirma que ninguém, além da própria pessoa que cometeu o crime, pode cumprir a pena pelo fato. Neste caso, quem acaba cumprindo a pena também é a criança ou o feto. Ou seja, a gente se baseia neste princípio para entender que a criança não pode deixar de ter o afeto materno em razão de um erro que a mãe cometeu”, pontua Ribeiro. Segundo ele, a legislação destaca que pessoas acusadas de crimes cometidos com violência ou grave ameaça, ou contra os próprios filhos, não têm direito à substituição da pena privativa de liberdade por prisão domiciliar. 

O projeto “Sexta-feira na Cadeia”, que realiza atendimentos semanais na Cadeia de Umuarama, teve início no final de 2019 e já realizou cerca de 400 atendimentos, 286 só em 2022. Atualmente, são atendidas de 10 a 20 pessoas a cada sexta-feira, que recebem informações sobre o andamento de seus processos, eventuais benefícios alcançados e datas de audiências. 

 

 

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