Defensoria expede Recomendação aos serviços de saúde do Paraná sobre a ilegalidade da esterilização compulsória 01/08/2022 - 15:40

Em junho, a Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR) em Castro recebeu a notícia de que a Secretaria Municipal de Saúde havia encaminhado uma paciente com laudo médico psiquiátrico atestando esquizofrenia paranoide para o procedimento de laqueadura de forma compulsória, isto é, sem o consentimento da própria mulher. A paciente é assistida pela Defensoria Pública na área cível junto com sua mãe, que busca, na Justiça, ser a sua curadora. Porém, a mulher, orientada pelo serviço de saúde, queria autorizar a laqueadura em nome da filha, o que viola a legislação. 

A defensora pública coordenadora do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (NUDEM), Mariana Martins Nunes, explica que a curatela se limita a questões cíveis, como o controle de bens patrimoniais, e não aos direitos de personalidade, como o direito à vida sexual e reprodutiva.

“A laqueadura, que é uma forma de esterilização, só pode ser feita com o consentimento livre e informado da mulher. Neste caso, o que havia era uma autorização da mãe e a indicação do médico para que se fizesse a laqueadura, o que é considerada uma esterilização compulsória, porque não havia a manifestação de vontade da mulher de fazer o procedimento”.

O caso chegou ao Núcleo através da DPE-PR de Castro e a equipe da sede foi orientada a conversar com a mãe da paciente sobre a ilegalidade do procedimento. A mulher então desistiu de dar continuidade ao pedido. O NUDEM, então, expediu, no início do mês de julho, uma recomendação à Secretaria Municipal de Saúde de Castro para que sejam respeitados os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres com deficiência, e que os serviços de saúde não realizem encaminhamentos para a esterilização compulsória.

Recomendação às regionais de saúde do Paraná

Para garantir que a recomendação chegue a mais profissionais da Saúde, o NUDEM expediu na última sexta-feira (29/07) a mesma Recomendação aos serviços de saúde do Estado do Paraná. “Foi mais de forma preventiva, considerando-se que essa prática ainda acontece em todo o Brasil, conforme algumas notícias recentes veiculadas na mídia”, explica a coordenadora do Núcleo.

O documento é semelhante ao que foi encaminhado à Secretaria Municipal de Saúde de Castro e recomenda que os(as) profissionais dos serviços de Saúde orientem as mulheres com deficiência e/ou em uso abusivo de álcool e outras drogas, e eventuais curadores(as) e/ou familiares que as acompanhem, sobre a forma como podem ser exercidos seus direitos sexuais e reprodutivos, bem como acerca de contraceptivos, planejamento familiar e programas socioassistenciais. Também recomenda que não encaminhem essas mulheres para a esterilização voluntária caso elas não se enquadrem nos requisitos estabelecidos pela legislação, e que, em hipótese alguma, encaminhem para esterilização forçada, sob pena de violação de direitos fundamentais da pessoa com deficiência e configuração de crime de acordo com o artigo 15 da Lei 9.263/96. A recomendação ainda ressalta que, ainda que exista laudo médico e autorização do(a) curador(a), a esterilização continua sendo forçada.

Clique aqui e leia a Recomendação na íntegra.

O que diz a lei

Segundo a Lei do Planejamento Familiar (Lei 9.263/96), em seu artigo 10, “a esterilização cirúrgica em pessoas absolutamente incapazes somente poderá ocorrer mediante autorização judicial, regulamentada na forma da Lei”. Quanto à esterilização compulsória, isto é, sem a autorização da mulher, não há nenhuma lei que autorize este procedimento, ainda que sob justificativa de tratamento e/ou com autorização judicial. Além disso, de acordo com o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei Federal 13.146/2015), a deficiência não afeta a capacidade civil em relação ao exercício dos direitos sexuais e reprodutivos e às decisões quanto ao planejamento familiar. 

Por fim, o artigo 15 da Lei do Planejamento Familiar estabelece que realizar esterilização cirúrgica em desacordo com o estabelecido na Lei pode acarretar em reclusão de dois a oito anos, ou multa. A pena é aumentada se a esterilização for praticada durante os períodos de parto ou aborto; com manifestação da pessoa esterilizada expressa durante a ocorrência de alterações na capacidade de discernimento por influência de álcool, drogas, estados emocionais alterados ou incapacidade mental temporária ou permanente; por meio de remoção do útero (histerectomia) e/ou ovário(s) (ooforectomia); em pessoa absolutamente incapaz, sem autorização judicial; ou através de cesária indicada para fim exclusivo de esterilização.

 

 

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