Qual é a importância do seu nome? A palavra pela qual somos reconhecidas(os) por, praticamente, toda a vida, é o que nos dá uma identidade no mundo. É pelo nome que seremos individualizadas(os), chamadas(os) e lembradas(os) por toda a sociedade e, especialmente, por aquelas(es) que mais amamos. E o que aconteceria se um nome pelo qual você tem muito apreço fosse mudado? Essa é uma história com muitos meandros, mas com um final feliz, graças à Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR).

Tudo começou quando Mery Ellen procurou o cartório para mudar de nome em agosto do ano passado. Com a aprovação da Lei 14.382/2022 naquele mês, pessoas maiores de 18 anos passaram a poder alterar seu prenome e sobrenome independentemente do motivo. Ela então viu a chance de mudar o prenome com o qual, desde os dez anos de idade, não se identificava e pelo qual chegou a sofrer bullying na escola. Mas a mudança afetou o seu segundo nome, Francisca, que passou a ser Francisco na nova certidão.

A gente explica: o sobrenome da mãe de Mery Ellen é Francisco, com “O”, mesmo. Mas tanto Mery Ellen quanto suas três irmãs tinham como segundo nome “Francisca”, com “A”, e apenas o sobrenome do pai, Vieira. Mas durante o procedimento de mudança de prenome, segundo Mery Ellen, a atendente do cartório a levou a entender que seria necessário atualizar o seu “sobrenome” para que ele estivesse de acordo com o registro de sua mãe. Quando, enfim, ela foi ao cartório para buscar a nova certidão, o que era pra ser um sonho se tornou um pesadelo: seu novo nome era Mery Ellen FRANCISCO Vieira.

“Fui pra casa e chorei muito, sem saber o que fazer, o que tinha acontecido. Liguei para o cartório, expliquei que meu nome havia ficado no masculino e a atendente pediu para dar uma olhada na certidão. Enviei via Whatsapp, ela conferiu e falou que estava correto”, relembra. Após inúmeras ligações para o cartório na tentativa de reverter a situação, ela foi orientada a procurar a Vara de Registros Públicos para realizar uma nova retificação. Foi lá que ela foi informada de que a Defensoria Pública poderia ajudá-la.

O setor de Registros Públicos da DPE-PR, então, entrou na Justiça para retificar o registro civil, uma vez que a Lei 14.382/2022 permite a alteração imotivada de prenome por via extrajudicial apenas uma vez, e ela já havia feito uso desse direito. Na ação, a Defensoria alegou que “após o recebimento do documento atualizado, [Mery Ellen] entrou em crise emocional por não se reconhecer mais com o nome de batismo dado por seu pai. A paciente traz que seu pai registrou todas as filhas com o nome Francisca por considerar inadequado um sobrenome masculino compondo o nome das filhas. Mery Ellen relata que o sentimento foi de não pertencimento ao seu núcleo familiar, gerando confusão mental quanto à sua identidade, profunda tristeza e ansiedade”. Até hoje, ela faz acompanhamento psicológico e psiquiátrico para superar a crise de identidade que toda essa situação gerou. “Isso abalou totalmente a minha estrutura, a minha vida. Trouxe pra mim um dano emocional muito grande”, afirma.

“A Mery Ellen Francisca queria ter de volta a sua identidade, como pertencente ao seu grupo familiar. Na Defensoria Pública de Registros Públicos, muitas vezes, os casos não se resumem ao nome, sexo ou correção de erros, mas sim a devolver a identidade e a dignidade às pessoas”, resume a defensora pública Cinthia Azevedo Santos Pecher, que atendeu o caso.

O pedido seguiu todo o trâmite na Justiça, com a concordância do Ministério Público do Paraná (MPPR), que se manifestou favorável, e sentença do Tribunal de Justiça (TJ-PR) na última semana autorizando a retificação do registro para que Mery Ellen tenha, enfim, o nome que sempre desejou: Mery Ellen Francisca Vieira. “Estou sem acreditar! Vocês não devolveram apenas o meu “A”, e, sim, a minha vida. Estou muito grata a vocês, que têm um trabalho lindo. Parabéns!!! Obrigada por tudo, mesmo”, comemorou ao receber a decisão.