Mãe solo que teve a prisão decretada por não conseguir pagar pensão reverte decisão por meio de atuação da DPE-PR em Cambé 07/08/2023 - 15:43

A 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) concedeu liminar em Habeas Corpus, a pedido da Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR) de Cambé, para impedir que uma mãe solo fosse presa por não pagar pensão alimentícia. Havia uma ordem de prisão civil contra ela por não pagamento de pensão alimentícia para sua filha de sete anos, acolhida pela avó paterna. A usuária da DPE-PR está desempregada, pois foi acometida por uma tendinite crônica. Ela é a responsável pela própria subsistência e a de seus outros quatro filhos.

A criança já era mantida pela avó há cinco anos, contudo, a tutela não era formalizada judicialmente. Em março deste ano, foi realizada a audiência de conciliação entre a avó paterna e a mãe – que é assistida pela Defensoria Pública – para regulamentar as questões de guarda e pensão alimentícia. As partes entraram em acordo somente sobre a guarda, em que foi decidida a modalidade unilateral em favor da avó – ou seja, a guardiã é a avó, mas a mãe tem o direito de visita e de supervisão nas decisões sobre a criação e educação da criança. 

A guardiã, no entanto, solicitou a prestação de alimentos apenas à genitora, e não ao genitor, que é seu filho. A Defensoria, portanto, contestou a obrigação da mãe de prestar alimentos, em razão de sua hipossuficiência, e solicitou que o pai também fosse responsabilizado pelos alimentos.

Os rendimentos da usuária provêm unicamente de auxílios do governo (Bolsa Família, Benefício Primeira Infância e Auxílio Gás), o qual totalizam um valor inferior a um salário mínimo nacional. As despesas mensais para sustentar os quatro filhos, que ainda são crianças ou adolescentes, por sua vez, ultrapassam os valores recebidos. Além disso, em razão de sua tendinite crônica, a mãe não poderia trabalhar até, no mínimo, o mês de junho, impedindo um aumento de sua renda. 

Após a contestação, a juíza da Vara de Família de Cambé decidiu acatar parcialmente o pedido da Defensoria: obrigou o genitor a prestar alimentos, mas, ainda assim, fixou a obrigação da mãe de prestar os alimentos provisórios, ainda que com um valor menor do que o proposto anteriormente. 

Por conta da impossibilidade financeira da mulher, a primeira parcela da pensão venceu sem ser paga, e a avó solicitou a prisão da devedora. A justificativa da usuária não foi acolhida e a prisão foi decretada. No Brasil, o não pagamento de pensão é o único caso em que pode ocorrer a prisão civil por dívidas. (Entenda mais sobre a prisão em caso de dívida de pensão alimentícia no fim da matéria) 

A Defensoria Pública emitiu um pedido de liminar em Habeas Corpus (remédio constitucional que garante a liberdade de alguém) para que a ordem de prisão fosse suspensa. “A prisão dessa mãe não atingiria o objetivo perseguido pela prisão civil, que é o de garantir, por meio da coação, a sobrevivência da criança. A filha já era mantida pela avó, a qual possui boa condição financeira. Além disso, o descumprimento cometido por essa mãe é involuntário e inescusável, de forma que seu cárcere seria extremo e indevido”, explica Isabela Quero Veloso, assessora jurídica na área de Família e Sucessões e da Infância e Juventude na comarca de Cambé. 

A desembargadora substituta da cidade da região metropolitana de Londrina concedeu a liminar em favor da usuária da DPE-PR, reconhecendo que este é um caso peculiar, o qual deve ser examinado de maneira mais analítica – já que a mãe tem outros filhos sob sua dependência e que ficariam desassistidos caso a prisão fosse executada. 

Para Veloso, a decisão da magistrada reflete a importância de o Poder Judiciário analisar o contexto socioeconômico em que se desenrola cada caso. “Na sociedade em que vivemos, cuja estrutura é patriarcal, e em que cabe à mulher-mãe suportar todos os gastos e demais responsabilidades de cuidar sozinha dos filhos, as quais vão além de despesas materiais, é grande o papel da Justiça em não apenas cumprir o Direito, mas atender a uma demanda social”, analisa.

Agora, o próximo passo será o julgamento de mérito do caso, que consiste em uma análise do pedido de Habeas Corpus feito no processo, realizado por um grupo de desembargadores em sessão de julgamento. 
 

Como ocorre a prisão civil pelo não pagamento de pensão alimentícia?

A prisão civil por dívidas só pode ocorrer mediante o não pagamento de pensão alimentícia. Isso é determinado pelo artigo 528 do Código de Processo Civil, o qual afirma que "no cumprimento de sentença que condene ao pagamento de prestação alimentícia ou de decisão interlocutória que fixe alimentos, o juiz, a requerimento do exequente, mandará intimar o executado pessoalmente para, em 3 (três) dias, pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo". O parágrafo 3.° afirma: "Se o executado não pagar ou se a justificativa apresentada não for aceita, o juiz, além de mandar protestar o pronunciamento judicial na forma do § 1º, decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses".

Quando o(a) alimentante, ou seja, a pessoa responsabilizada por prestar alimentos – podendo ser o genitor, genitora ou até avós que não moram com o(a) alimentado(a) – não realiza o pagamento, o(a) tutor(a) pode pedir a sua prisão ou a penhora (apreensão) de seus bens a partir da primeira parcela vencida. O(a) devedor(a), por sua vez, poderá apresentar a justificativa do não pagamento ou provar que já o fez. 

A lei autoriza que o pedido de execução seja feito referente às últimas três parcelas vencidas (e todas que vencerem no decorrer do processo), no máximo, pois, mais do que isso, entende-se que a pensão não é mais urgente. 

A Lei de Alimentos, no artigo 19, também acrescenta que o(a) juiz(a) poderá decretar todas as providências necessárias para o cumprimento do acordo, inclusive decretar a prisão do(a) devedor(a) em até 60 dias. 

Caso o(a) devedor(a) não tenha condições de arcar com os alimentos, é possível pedir diminuição do valor ou, como no caso da usuária, solicitar a desobrigação de prestar alimentos, mediante comprovação de hipossuficiência, e também de acordo com a necessidade da criança ou do adolescente. 

 

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