Júri realizado nesta terça (21/03) em Curitiba é marcado por atuação inédita da Defensoria do Paraná 22/03/2023 - 15:04

Um homem acusado de tentar matar a companheira a tiros em 2010, e depois a facadas em 2012, foi condenado a 25 anos e seis meses de reclusão após julgamento realizado pelo Tribunal do Júri de Curitiba na tarde desta terça-feira (21/03). O cumprimento inicial da pena será em regime fechado, e o homem tem o direito de recorrer da sentença em liberdade*. O júri popular, responsável por julgar crimes dolosos contra a vida, concluiu que o réu é culpado por tentar matar a vítima em duas circunstâncias diferentes. O caso julgado nesta terça-feira ficou marcado pela atuação da Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR). 

Pela primeira vez na história da instituição, que ainda tem 11 anos de existência, um defensor público atuou, em plenário, na defesa do réu e outro defensor público, também em plenário e com independência e autonomia, atuou em defesa dos direitos da vítima, participando, inclusive, da sustentação oral, ou seja, quando o(a) defensor(a) se dirige aos jurados e juradas para sustentar os seus argumentos a respeito do caso. Na área da Família, a Defensoria já atua desta forma, pois há sempre dois defensores(as) públicos(as) que defendem, cada um(a), o interesse de um dos lados.

Neste processo, o réu havia sido pronunciado pela 2ª Vara do Tribunal do Júri de Curitiba, onde tramitou o caso, por tentativa de homicídio com o agravante de se valer da relação doméstica que tinha com a vítima. A figura do feminicídio, que é um tipo de homicídio qualificado, praticado contra a mulher em situação de violência doméstica e familiar, não aparece no histórico dos autos em razão de os crimes terem sido cometidos antes de 2015, ano em que a Lei nº 13.104/2015, que prevê a criação do tipo penal de feminicídio, foi sancionada.O homem, portanto, não foi denunciado por feminicídio.

Durante o julgamento, foram ouvidas duas testemunhas. Entre elas, estavam a vítima e um vizinho dela, que responderam perguntas do Ministério Público do Paraná (MP-PR), do defensor público David Alexandre de Santana Bezerra, no papel de defensor da vítima, e do defensor público Vitor Eduardo Tavares de Oliveira, defensor do réu, que optou por permanecer em silêncio. Os debates entre o MPPR e a defesa da vítima, de um lado, e a defesa do réu, de outro, começaram logo em seguida. A sessão de julgamento durou mais de oito horas. 

Ao fazer a sua sustentação oral,  Bezerra destacou que a decisão do júri impacta muito além do caso julgado naquele dia, pois ele ocorre no contexto de uma sociedade com altos índices de violência doméstica e familiar contra a mulher. 

"Foi um júri muito importante e com um resultado coerente com os fatos. Atuei com total autonomia em favor da vítima. O resultado foi satisfatório. A vítima, apesar da tristeza e sofrimento que toda essa história acarreta, ficou satisfeita", afirmou Bezerra.

Já na avaliação de Oliveira, o julgamento aconteceu dentro da normalidade , conforme se esperava, com respeito e, ao mesmo tempo, total autonomia das partes uma em relação à outra. “Em relação ao réu, orientamos ele muito bem, mas ele preferiu ficar em silêncio. Nós vamos recorrer para diminuir a pena, e também por um novo júri, porque entendemos que não há provas suficientes em relação ao primeiro fato, ocorrido em 2010. Sobre a participação do colega, pela vítima, vi como uma atuação natural, tranquila, tendo cumprido o dever de atender ao direito da vítima”, pontuou.

O caso 

A primeira tentativa de homicídio contra a mulher ocorreu em 2010, no bairro Vista Alegre, em Curitiba. O réu atirou na região da perna, próximo ao fêmur, e tentou atirar no peito da vítima, mas a arma falhou. Na segunda, no mesmo bairro, já em 2012, o réu desferiu cinco golpes de faca na companheira. Nos dois episódios, a vítima conseguiu sobreviver porque foi socorrida pelo Serviço Integrado de Atendimento ao Trauma em Emergência (SIATE) e levada a um hospital da cidade. A vítima chegou a ser atendida também pela Defensoria na Casa da Mulher Brasileira de Curitiba. Durante o processo, o réu respondeu à acusação do MPPR em liberdade. 

*É direito da pessoa condenada pelo júri popular recorrer da sentença em liberdade, uma vez que ainda não se esgotaram todos os recursos que lhes são garantidos e ela está contemplada pelo princípio da presunção de inocência. O réu apenas é preso caso haja uma ordem de prisão preventiva decretada, e desde que de acordo com uma das hipóteses estabelecidas pelo artigo 312 do Código de Processo Penal para a decretação desse tipo de prisão.