Defensoria reverte prisão de mãe em situação de extrema vulnerabilidade por dívida de pensão alimentícia 12/09/2025 - 17:07

A Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR) em Cascavel conseguiu a revogação da prisão civil de uma mãe que não conseguia pagar a pensão alimentícia do filho. A decisão, considerada rara pela própria instituição, levou em conta a situação de extrema vulnerabilidade da mulher. Ela enfrenta problemas de saúde e renda, além de cuidar de outro filho e dos pais, já idosos.

O caso teve início quando a Justiça decretou a prisão da mulher pelo não pagamento de pensões referentes aos meses de junho, julho e agosto de 2024, além das que venceram ao longo do processo. Em sua defesa inicial, ela já havia informado estar desempregada, com problemas físicos que limitavam sua capacidade de trabalho e que cuidava de um filho que faz acompanhamento no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS). 

No entanto, a justificativa não foi aceita em um primeiro momento. O juízo entendeu que dificuldades financeiras e a alegação de problemas de saúde, sem provas robustas, não seriam suficientes para isentá-la da obrigação. A decisão destacava que o pagamento da pensão é indispensável para o sustento da criança, e que a mãe não havia tomado as medidas judiciais cabíveis a tempo.

Uma atuação integrada para garantir direitos

A situação começou a mudar após a decretação da prisão. Com a mulher já detida, o defensor público Ricardo Santi Fischer, responsável pelo caso, estabeleceu uma atuação conjunta com a equipe multidisciplinar da Defensoria Pública. A assistente social da DPE-PR Janaína Teixeira foi contatada pela coordenadora do CAPS, que atendia a mãe e buscava ajuda para o caso.

"Essa articulação com a rede de proteção é muito importante, porque os técnicos que acompanham a família no dia a dia conhecem a fundo suas vulnerabilidades. Quando eles nos trazem esse relato, temos a real dimensão da situação, e quem ganha é o cidadão, que passa a ter uma defesa completa, para além da questão processual", explica Janaína.

A partir desse contato, a equipe do CAPS encaminhou um documento detalhado à Defensoria, com histórico de vida da mulher. O relatório revelou um quadro ainda mais complexo: ela havia sofrido um grave acidente de carro aos 19 anos com sequelas neurológicas, não conseguia se manter em empregos, aguardava consulta com neurologista por comprometimento de suas funções cognitivas, investigava um possível câncer e fazia acompanhamento psiquiátrico. 

Além disso, o documento reforçava que ela era a única responsável por um filho adolescente, sem registro paterno, que também demandava cuidados de saúde mental.

A prisão como medida ineficaz

A Defensoria Pública, então, protocolou um novo pedido, argumentando que a manutenção da prisão seria ineficaz e desumana. A defesa sustentou que a mulher, apesar de todas as dificuldades, realizava pagamentos parciais sempre que possível, demonstrando boa-fé. O ponto central da argumentação foi que a prisão civil serve para forçar o devedor a pagar, e não como uma simples punição. No caso dela, a detenção impediria a mulher de cuidar de sua própria saúde e de sua família.

"É fundamental ponderar que, embora a obrigação alimentar seja de suma importância, sua execução não pode se sobrepor a direitos fundamentais de igual ou maior envergadura, especialmente quando o devedor se encontra em situação de extrema vulnerabilidade”, destacou o defensor público no pedido.

A nova perspectiva foi acolhida também pelo Ministério Público, que se manifestou favoravelmente à revogação da prisão, sugerindo a suspensão da medida ou a conversão em prisão domiciliar.

Uma nova decisão judicial baseada na realidade dos fatos

Diante dos novos elementos, a Justiça reviu sua decisão inicial e determinou a soltura imediata da mulher. O juízo reconheceu que, em situações excepcionais como essa, em que fica comprovada a incapacidade real de trabalhar, o não pagamento da pensão é involuntário e justificável. A decisão final cita diretamente as informações fornecidas pelo CAPS e destaca que a prisão, mesmo em regime domiciliar, a impediria de realizar o tratamento médico e de acompanhar o filho.

Para Fischer, o resultado evidencia a importância de uma análise detalhada e sensível de cada caso. "Não é comum a mãe ser a devedora de alimentos e ser presa por isso. Com o novo contexto que nos foi apresentado pelo trabalho exemplar de nossa assistente social em contato com a rede de apoio, conseguimos justificar que a prisão não cumpriria seu papel de coerção, uma vez que ela efetivamente não tinha como fazer o pagamento. Acolheu-se o nosso argumento e a prisão foi revogada no dia seguinte", conclui ele.