DPE-PR aplica novo entendimento sobre posse de maconha e consegue na Justiça a absolvição de adolescente apreendido com 3g da substância 05/08/2024 - 12:38

Em julho, a Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR) conseguiu a absolvição de um adolescente apreendido com aproximadamente três gramas de maconha aplicando o novo entendimento da Justiça a partir do julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 635659, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que descriminalizou o porte de maconha para consumo pessoal. 

Em junho, o adolescente de 17 anos foi abordado pela polícia em um bairro de Curitiba e, na revista, foi constatado que ele estava com aproximadamente três gramas de maconha. Os policiais foram até a residência do adolescente, onde ele morava com outros dois adolescentes, e encontraram mais drogas, que ele alegou que desconhecia e que eram dos outros adolescentes que viviam no local. Os demais moradores não estavam na casa neste momento. 

O Ministério Público, então, representou o adolescente por tráfico, atribuindo a ele a posse de toda droga que foi encontrada na residência. A Justiça recebeu a representação por tráfico e concedeu a internação provisória do adolescente. Dias depois, na audiência de apresentação, o adolescente sustentou que as drogas encontradas na casa não eram dele. O Ministério Público apresentou as alegações finais pedindo a procedência da representação por tráfico com medida de internação. A Defensoria, no entanto, defendeu que a quantidade de droga apreendida com o adolescente na rua era insuficiente para caracterizar tráfico, e que não era possível provar que a droga na residência era sua.

“É evidente a irrelevância da quantidade da matéria apreendida. Nesse sentido, é impossível equiparar a ação do adolescente à conduta mais grave que a simples posse de droga em condição de usuário”, defendeu a DPE-PR. “Ressalta-se que o ônus da prova da destinação da droga a terceiros é do titular da ação socioeducativa em face do princípio da presunção da inocência”.

A Defensoria também destacou a recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que descriminalizou o consumo da droga para uso pessoal, e argumentou que “se reconhecido que não há fundamentação para responsabilizar o adolescente por tráfico de entorpecentes detidos na residência por ele indicada, não há que se falar em responsabilidade penal frente ao porte de três gramas de substância análoga à maconha.” 

O defensor público que atuou no caso, Daniel Alves Pereira, explica que o STF decidiu, por maioria, que o artigo 28 da Lei 11.343/2006, conhecida como “Lei Antidrogas”, que criminaliza o uso de drogas, não se aplica ao uso de maconha. No mesmo julgamento, a Corte fixou que a posse de até 40 gramas de maconha ou seis plantas fêmeas de cannabis trazem a presunção de que se trata de uma situação de uso, não de tráfico.

“Juntando as duas premissas do julgamento, uma apreensão de até 40 gramas de maconha presume-se para uso e não pode ser criminalizado. Ainda, como o Brasil é signatário de tratados internacionais que vedam o tratamento de adolescentes em conflito com a lei de maneira mais gravosa do que adultos, este entendimento também cabe para os atos infracionais praticados por adolescentes”, argumenta o defensor.

A Justiça acolheu os argumentos da Defensoria de que não havia elementos concretos indicando que a droga apreendida com o adolescente fosse destinada ao comércio e desclassificou o delito de tráfico para delito de uso de drogas.

“Em obediência ao princípio in dubio pro reo [“na dúvida, a favor do réu”], impõe-se desclassificação da conduta narrada na representação para porte de drogas para consumo próprio em relação a três gramas de maconha encontradas no adolescente. E considerando recente decisão do Supremo Tribunal proferida em sede do Recurso Extraordinário 635.659 e é de ser reconhecida a atipicidade da conduta do representado, conforme tese fixada”, determinou a sentença. Assim, a representação por tráfico de drogas foi julgada improcedente e o adolescente foi absolvido.

O jovem possui outras acusações de atos infracionais. Para o defensor público, o caso demonstra a importância do papel da Justiça em julgar apenas os fatos em questão, verificar se há provas ou não sobre a acusação específica que está sendo feita, sem considerar o passado da pessoa que está sendo julgada. 

“No caso em questão, não havia prova alguma de que a droga encontrada fosse do adolescente e a única ligação que faziam era uma indução de que o rapaz, uma vez com outros registros passados, estaria traficando novamente. Aceitar essa linha de raciocínio é contrário aos cânones do direito penal e processual penal, enfraquece a presunção de inocência e legitima o direito penal do autor”, defende Pereira.