Com a palavra, a Defensoria: Karen Xavier Scarpin Preiszner, técnica administrativa 28/10/2025 - 07:00
Neste 28 de outubro, dia em que se comemora o Dia do Servidor Público, o projeto “Com a Palavra, a Defensoria” conversa com uma servidora que personifica a paixão pela instituição e pelo trabalho que realiza. Aos 45 anos, a técnica administrativa Karen Xavier Scarpin Preiszner tem uma trajetória marcada pela perseverança e por um profundo vínculo com Campo Mourão, sua cidade natal. Ela atua na comarca há quase uma década.
Com três graduações concluídas – a última, em Direito, a realização de um sonho –, Karen não apenas contribui para o atendimento diário à população, mas também se tornou protetora da memória viva da sede: ela cataloga e preserva todos os registros históricos da unidade desde a sua instalação naquele município. Essa dedicação a levou a um novo e objetivo: o de se tornar defensora pública.
Servidoras e servidores
Hoje, a DPE-PR conta com 617 profissionais, entre defensores, defensoras, servidores e servidoras, que atuam em todas as áreas. De atendimento jurídico a atividades operacionais e de planejamento administrativo. Defensores, assessoras jurídicas, psicólogos, assistentes sociais, contadoras, engenheiros, jornalistas e inúmeras outras.
“O resultado que vemos diariamente na vida da população atendida só é possível com o compromisso de todos e todas que trabalham nesta instituição e escolheram abraçar a causa do acesso à justiça”, afirmou Matheus Munhoz, defensor público-geral. “Por isso, homenagear nossos servidores e servidoras é reconhecer a necessidade de fortalecer a Defensoria Pública e a importância de impactar cada vez mais a vida da população paranaense”.
Olhar humano
Na entrevista a seguir, Karen relembra os desafios do início da Defensoria na comarca, detalha a jornada para conciliar trabalho, família e estudos, e compartilha sua definição sobre o que é ter um “olhar humano” no serviço público.
Gosto de iniciar a entrevista pedindo por uma breve retrospectiva da vida: onde nasceu, cresceu, como é sua família... Um pequeno retrato seu.
Eu sou a Karen, nascida e criada em Campo Mourão. Estudei a vida toda aqui. Sou mãe de duas meninas, e estou casada há quase três anos.
A decisão de buscar uma carreira pública surgiu em um momento de recomeço na minha vida. Após uma separação e o retorno a Campo Mourão, decidi, em 2012, fazer um cursinho preparatório para concursos. Naquele ano, foi publicado o edital para servidores da Defensoria Pública.
Confesso que, naquele momento, eu não sabia ao certo o que era a Defensoria. Pesquisei sobre a instituição, me inscrevi e fiz o concurso em Curitiba, em setembro de 2012. Veio o resultado. Para minha grande surpresa e felicidade de toda a família – algo que ainda me emociona –, fui aprovada em primeiro lugar como técnica da região.
E como foi esse início, depois da aprovação festejada?
Lembro claramente do primeiro dia. Era uma terça-feira e, ao voltar para casa após o trabalho, eu chorava. Era um choro de alegria, porque era uma grande conquista. Primeiro vem a aprovação, depois a posse e o exercício do cargo. O meu trabalho na Defensoria Pública me abriu espaços e me deu a oportunidade de realizar sonhos. O primeiro deles foi justamente poder cursar Direito.
A partir dessa conquista, tenho condições de realizar outros sonhos. O principal deles é, muito em breve, me tornar defensora pública e poder atuar aqui em Campo Mourão, a minha cidade.
De onde surgiu essa vontade? O que a fez se interessar pela área?
Essa vontade surgiu ainda no ensino médio. Na minha percepção, o Direito é um instrumento não apenas para “fazer justiça” de uma forma abstrata, mas sim para garantir o acesso a ela. Eu o via como um meio de buscar o que é mais correto e justo para as pessoas. Foi com essa perspectiva que passei a enxergar a profissão.
Sua família é de Campo Mourão? Isso parece explicar a forte conexão e o carinho que você tem pela cidade, certo?
Minha família inteira é de Campo Mourão. Na verdade, ela faz parte de uma das famílias pioneiras da cidade. Meu bisavô paterno chegou à região por volta de 1850, em uma época em que aqui ainda não havia praticamente nada. O legado deles é reconhecido até hoje; tanto meu bisavô quanto meu avô dão nome a avenidas. Minha mãe também nasceu aqui, em 1951.
E como era o fluxo de atendimentos da Defensoria no início da sede em Campo Mourão?
É interessante notar que, ao contrário do que se poderia imaginar, nós nunca precisamos ir atrás das pessoas; elas sempre procuraram a Defensoria.
Me recordo que chegava para trabalhar por volta das 10h da manhã e já encontrava um número considerável de gente esperando em uma pequena área externa, mesmo que o atendimento só começasse ao meio-dia. Nos dias de atendimento da área de Direito da Família, as filas eram enormes.
O mais impressionante é que isso acontecia mesmo com a sede localizada em um bairro distante. Víamos pessoas vindo de regiões ainda mais afastadas. Muitas mães com os filhos no colo, chegando a pé em busca de vagas em creches por não terem dinheiro para o transporte público.
Diante dessas histórias e de todo o esforço das pessoas para chegarem até vocês, como você se sentia no final de um dia de trabalho?
Acima de tudo, me sentia humana. Lembro do que meu irmão disse quando me indicou o concurso: “Karen, você vai conhecer um lado da vida que nós nem imaginamos que existe”. E ele tinha razão.
Percebi que muitas pessoas vêm à Defensoria não apenas para ter seu problema resolvido, mas para serem ouvidas.
Elas precisam de alguém que pare, as escute e ofereça uma orientação adequada. Mesmo que a solução não esteja aqui, o simples ato de direcionar já faz uma diferença imensa. É esse sentimento de utilidade que me preenchia. Um lado mais humano realmente aflora em nós.
Como a função de técnica administrativa era no início e como ela se transformou ao longo do tempo?
Quando comecei, minha função incluía o atendimento ao público, a solicitação de materiais, o encaminhamento de ofícios e a rotina geral. Com o passar do tempo, a própria Defensoria evoluiu e novas necessidades surgiram, levando à criação da função de gestor administrativo da sede. Essa nova atribuição ficou sob minha responsabilidade. Hoje, acumulo as duas frentes: continuo realizando o primeiro atendimento e também cuido da gestão, o que envolve o controle de materiais e do patrimônio.
E o que te ajuda também são as suas três formações, porque elas se correlacionam no seu trabalho.
Elas se correlacionam totalmente e me ajudam imensamente. A graduação em Administração é a base para as minhas tarefas na gestão da sede. A formação em Letras é fundamental para a comunicação escrita, na elaboração de textos e ofícios. E o Direito, naturalmente, é o conhecimento que envolve e permeia todo o nosso trabalho.
O seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) na faculdade de Direito tem relação direta com a Defensoria. Conte um pouco sobre ele.
Meu TCC foi sobre “A Defensoria Pública como órgão de acesso à justiça para a população hipossuficiente da comarca de Campo Mourão”. Depois de tantos anos imersa nesse universo, eu não poderia falar de outra coisa senão do acesso à justiça para as pessoas que precisam.
A comarca de Campo Mourão abrange quatro cidades, somando uma população de quase 200.000 pessoas que necessitam desse atendimento. Sem a Defensoria, elas estariam desassistidas.
O processo de pesquisar as origens da Defensoria, desde a Constituição Federal até a lei estadual que a instituiu, foi fundamental. Esse estudo aprofundado só reforçou minha compreensão sobre a imensa importância que a nossa instituição tem na vida das pessoas.
E como surgiu a ideia de armazenar os registros da sede?
A ideia surgiu porque nós começamos a história da Defensoria em Campo Mourão a partir de uma folha em branco. Senti a necessidade de registrar essa trajetória desde o início, então passei a imprimir e catalogar todas as notícias sobre a nossa sede que saíam na mídia local.
Ela é muito histórica. Contém, por exemplo, o registro da inauguração da sede, um evento ao qual compareci mesmo antes de ser nomeada, em maio de 2016.
Essa pasta de registros também guarda reconhecimentos importantes, como um termo de audiência em que um juiz elogia o “excelente trabalho” que a Defensoria realiza.
Considero isso muito emblemático, porque, no começo, ouvíamos questionamentos sobre a necessidade de o Estado manter um serviço assim. Esse reconhecimento prova o que sempre soubemos: as pessoas precisam da Defensoria.
Na sua história, ser servidora não era um plano, mas hoje você sonha em ser defensora. Olhando para trás, como você descreve essa jornada e, em essência, o que é ser uma servidora da Defensoria para você?
Penso que é desenvolver um olhar humano, um olhar voltado para aqueles que precisam do nosso serviço. Acredito muito nisso. Para mim, o resumo de tudo é ter esse olhar de paciência e de compaixão pela pessoa que busca a nossa ajuda.
E como enxerga a construção do corpo de servidores da Defensoria ao longo desses anos?
Percebo que todos os servidores caminham no mesmo sentido. Compartilhamos a dedicação de sempre fazer o melhor possível.
Quem é a Karen fora do trabalho?
Foram tantos anos com foco total nos estudos que, se me perguntarem, vou dizer que meu hobby é estudar (risos). Mas, brincadeiras à parte, a Karen fora da Defensoria é muito dedicada à família – sou “mãezona”, cuido da casa, sou esposa. Estou, aos poucos, retomando o gosto por ir à academia, pois entendo que cuidar do corpo é fundamental para a qualidade de vida.
No geral, me considero uma pessoa alegre e grata. Tenho uma filosofia de que, no fim, as coisas se ajeitam. Não por comodismo, mas por entender que as coisas são como devem ser. Se algo está errado, o caminho é consertar e seguir em frente.
Para encerrar, e pensando nos marcos que se aproximam – 10 anos da Defensoria em Campo Mourão e 15 anos da instituição no Paraná –, que mensagem você gostaria de deixar sobre o futuro da Defensoria?
A Defensoria do Futuro que imagino, desejo e visualizo é uma instituição bem estruturada, que continua olhando para as pessoas que dela precisam. Uma Defensoria que faz os investimentos necessários e oferece aos seus servidores uma estrutura de trabalho completa – física, tecnológica e humana –, para que possamos chegar onde precisamos chegar. E que essa Defensoria, que alcança as pessoas do lado de fora, comece primeiro dentro de cada um de nós que fazemos parte dela.


