Após pedido da Defensoria, justiça revoga prisão preventiva de mulher indígena acusada do homicídio do companheiro 04/07/2022 - 11:36

Após a atuação das Defensorias Públicas do Tribunal do Júri da comarca de Curitiba, uma decisão concedida pela juíza Mychelle Pacheco Cintra Stadler, da 1.ª Vara do Tribunal do Júri de Curitiba, atendeu o pedido de revogação da prisão preventiva de uma mulher indígena acusada de homicídio simples contra o companheiro, presa desde agosto do ano passado. Mesmo presa há 10 meses, apenas recentemente, segundo a magistrada, a instrução do caso foi iniciada. 

O pedido, feito pelo Defensor Público Vitor Eduardo Tavares de Oliveira, argumenta que um laudo antropológico anexado ao processo da mulher indígena, pertencente à etnia Kaingang, aponta que ela mora em uma aldeia na região de Ivaí, na região dos Campos Gerais do Paraná, a qual foi muito afetada pela  presença de pessoas e da cultura branca não-indígena. Este e outros fatos geraram consequências na vida da usuária da DPE-PR, que culminaram na saída dela da tribo e seu afastamento da cultura indígena. Todos esses fatores, de acordo com Oliveira, podem ter contribuído para o crime imputado a ela. 

“Observou-se que ela abandonou os estudos formais na primeira infância para ajudar sua família na produção e venda de cestarias de Taquara; morou com a mãe até o começo da adolescência e, por força de atritos de origem religiosa, se mudou para morar com a irmã”, explicou o Defensor no pedido feito ao Poder Judiciário. Segundo Oliveira, a mulher começou a ingerir álcool por influência de pessoas que conheceu no centro do município de Manoel Ribas. 

O Defensor do Tribunal do Júri explica que o consumo abusivo de bebidas alcoólicas pela indígena é resultado também do afastamento da mãe, que era uma pessoa de referência da mulher; e do abandono escolar, episódios gerados por “ações invasivas dos brancos à tribo indígena”, que abrangem desde incursões militares no local, realizadas no século XIX, até ações de reforma estrutural da aldeia que é a sede da região, promovidas pelo Governo do Estado. 

A magistrada acolheu os argumentos da DPE-PR e revogou a prisão preventiva, condicionando a liberdade provisória da mulher indígena às seguintes medidas cautelares: comparecimento dela a todos os atos processuais e comparecimento quinzenal junto ao juízo da comarca de Manoel Ribas. Ela também irá usar tornozeleira eletrônica, mas como não há garantia de que o equipamento eletrônico funcionará naquela região, a mulher precisará cumprir a condição de comparecer presencialmente ao juízo a cada 15 dias. Ela também não poderá se ausentar, sem autorização judicial, da comarca em que passará a residir, e precisará se recolher em seu domicílio no período noturno e nos dias de folga. Ficou acordado que ela irá morar na casa da irmã, em uma aldeia em Ivaí. 

A usuária da DPE-PR já deixou as dependências do Complexo Médico Penal (CMP), em Pinhais, onde estava detida, logo após colocar a tornozeleira eletrônica. Ela está recebendo apoio da equipe de Psicologia e de Serviço Social da equipe da Defensoria Pública que atua no Tribunal do Júri de Curitiba para ser levada até a aldeia e cumprir as determinações judiciais. 

Durante a saída do CMP, na madrugada desta segunda-feira (04/07), a mulher indígena teve auxílio de um intérprete da língua Kaingang, a fim de conseguir se deslocar por Pinhais e Curitiba e pegar um ônibus para Ivaí. Ela não fala português. Segundo a psicóloga da Defensoria Mariana Levoratto, a oferta de um intérprete também busca auxiliar a mulher em seu direito de se informar sobre o seu processo, sobre o uso da tornozeleira eletrônica e sobre o cumprimento das determinações estabelecidas pela magistrada para que ela continue em liberdade.